Dias de Notícias

Notícias escritas e assinadas por mim, Marcelo Dias, a partir de 1998.

sábado, março 14, 1998

Flamengo até morrer

Torcedor que pediu garra ao time é morto a tiros em Bangu

RIO (O Globo) - Laércio Siqueira Pimentel, de 30 anos, o torcedor que na terça-feira entrou em campo para exigir garra dos jogadores do Flamengo, no jogo contra o Bangu, em Moça Bonita, chegando a jogar a camisa no gramado, morreu ontem por causa da raiva que ainda sentia pela falta de raça do seu time. Depois de discutir com um traficante do conjunto habitacional onde morava, na Rua Boa União, em Bangu, Laércio foi baleado a 20 metros de casa, morrendo a um quarteirão do estádio onde o Flamengo passou o seu último vexame, na derrota de 2 a 1.

Laércio fechou o lava-jato que mantinha com o pai, Laerte Siqueira Pimentel, cinco horas antes do horário normal. Ruth Maria Silva Campos, mulher da vítima, disse que ele chegara em casa às 15h e saíra para beber com amigos. O detetive Antônio Carlos Salomão, da 34ª DP (Bangu), revelou que Laércio estava bêbado e reclamou da falta de empenho do milionário elenco do Flamengo. E xingou um traficante, que defendia o time.

Assef diz que clube fará homenagem póstuma amanhã

Pouco depois da meia noite, o bandido, acompanhado por outros dois homens, disparou dois tiros que atingiram o peito e a barriga de Laércio. Socorrido pelo amigo José Carlos Campos, foi levado para o Hospital Albert Schweitzer, em Realengo, de onde foi transferido, em estado grave, para o Hospital Carlos Chagas, em Marechal Hermes.

Mas morreu às 3h10m, na mesa de cirurgia. Rubro-negro apaixonado, ele pretendia ir à Gávea exigir do presidente Kleber Leite uma nova camisa. O vice-presidente do Flamengo, Michel Assef, afirmou que o clube depositará uma coroa de flores e uma bandeira do time sobre o caixão de Laércio, que será enterrado hoje, no Cemitério do Murundu, em Bangu. Amanhã, no Maracanã, antes do clássico contra o Botafogo, haverá um minuto de silêncio.

Segundo Ruth Maria Silva Campos, Laércio assistia ao jogo pela televisão quando, aos 30 minutos do segundo tempo, resolveu ir até o Estádio de Moça Bonita.

- Ele disse que ia invadir o campo e mandar os jogadores honrarem a camisa do time.

O jogo entre Flamengo e Bangu tinha importância especial para a torcida. Depois da goleada de 5 a 0 para o Vitória da Bahia, pela Copa do Brasil, Romário & Cia. prometiam uma grande exibição para afastar a crise que rondava o clube. Só que as coisas não aconteceram como esperavam os jogadores, o técnico Paulo Autuori e os cerca de 2.500 rubro-negros que foram a Moça Bonita.

Logo no início do primeiro tempo, o Flamengo levou um gol de André. Sem paciência, os mais exaltados começaram a xingar alguns jogadores: o lateral-direito Alberto e os atacantes Palhinha eram os alvos preferidos. Romário, de pênalti, empatou. Mas a alegria não durou muito. Logo depois, o Bangu, através de Marquinhos, voltou a ficar na frente. Aos 38 minutos do segundo tempo, quando a derrota parecia inevitável, o ódio vindo da arquibancada pulou o alambrado. Revoltado, um torcedor invadiu o campo e correu em direção aos jogadores para tentar agredir Lúcio. Outros seguiram o exemplo. Entre eles estava Laércio Siqueira Pimentel, que chamou a atenção pelo fato de ter atirado a camisa do Flamengo no gramado, demonstrando, sem agressividade, toda a raiva que os torcedores sentiam do time naquele momento.

Esta não foi a primeira vez que a má fase do Flamengo resultou na morte de um torcedor. Na mais recente, em outubro de 1996, após uma goleada de 4 a 1 para o Vasco, no Campeonato Brasileiro, o porteiro Salvador Félix da Silva anos, matou com três tiros seu colega, o vascaíno Severino Laurindo, que o provocara.

COLABORARAM: Leslie Leitão e Gustavo Moraes