Dias de Notícias

Notícias escritas e assinadas por mim, Marcelo Dias, a partir de 1998.

sexta-feira, abril 17, 1998

As ’Carolinas’ esquecidas

Casos de vítimas que não são ricas e famosas mofam nas gavetas das DPs

RIO (Extra) - Das Laranjeiras, na Zona Sul do Rio, a Cabuçu, na Baixada Fluminense, o Rio de Janeiro está cheio de casos como o da estudante Ana Carolina da Costa Lino. Muitos são esquecidos e nem todos são tratados com a mesma atenção. O próprio Ministério Público reconhece o atual estado de violência provocado pelo tráfico de drogas e pelo contrabando de armas, fortalecendo os bandidos de todo o Rio. Crimes bárbaros contra jovens são praticados todos os dias e, na maioria das vezes, as famílias ficam sem uma explicação. No trânsito, o preço de um veículo acaba sendo a vida de seu dono. Mas a impunidade é a mesma.

O assassinato da estudante Ana Carolina da Costa Lino, de 18 anos, trouxe de volta um fantasma que ronda cada esquina da cidade. Não é preciso pesquisar muito para encontrar casos como o dela, morta por ladrões que agem no trânsito. Muitas vezes, esses crimes ficam impunes por falta de provas ou questões administrativas. A própria Justiça reconhece essa realidade de violência.

- A morte da Ana Carolina não é um fato isolado de nossa cidade. Outros como ela sofrem ataques de criminosos movidos por tóxico e fortemente armados - diz Luiz Carlos Caffaro, coordenador da 1ª Central de Inquéritos do Ministério Público estadual.

No dia 30 de janeiro, a professora Marize Marques Monteiro, de 34, foi morta a tiros por dois menores num cruzamento na Vila da Penha. Assim como Ana Carolina, Marize também se assustou e, ao esbarrar na embreagem do Fiat Tipo que dirigia, avançou com o carro, irritando os garotos.

De acordo com policiais da 38ª DP (Irajá), as investigações não evoluíram por insuficiência de provas e o inquérito foi encaminhado para o Tribunal de Justiça (TJ) - processo adotado 30 dias depois do registro de qualquer ocorrência.

Sem respostas também estão as mortes da professora Célia Maria Sábado Seabra, de 42, e do comerciante Sérgio Matos Rabetini, de 45, em 4 de janeiro de 1997 no Túnel Noel Rosa, no Jacaré.

O túnel foi fechado por um bando armado com metralhadoras. Assustados, o marido de Célia, Sérgio Campos Seabra, e Sérgio Matos Rabetini foram baleados ao tentar fugir.

Segundo o delegado Mário Azevedo, da 20ª DP (Vila Isabel), os assassinos não foram descobertos.

- A equipe começou a trabalhar em outubro e o inquérito já havia sido mandado para o TJ com os relatórios das investigações. Só ficamos com o boletim de ocorrência - justifica o detetive José Amaral.

A morte a caminho de casa

Até hoje a dona de casa Neuza Venâncio da Silva, de 44 anos, continua sem imaginar por que alguém mataria sua filha Luciana, de 21 anos. A moça, que morava com a mãe no Jardim Nóia, em São João de Meriti, saiu com amigos na noite do dia 18 de fevereiro e foi encontrada morta às 5h do dia seguinte, com o corpo perfurado por sete tiros, a menos de dois quarteirões de casa.

- A polícia só esteve aqui no dia da morte da Luciana - conta Neuza. - Até hoje choro a morte de minha filha.

Luciana era querida pelos vizinhos, que a descrevem como uma moça bonita, que saía à noite, namorava, mas não se envolvia em nada de errado.

- Ela era mais bonita do que a Carla Perez - diz a vizinha Maria das Graças Conceição, pedindo à Neuza para mostrar uma foto de Luciana.

Embora não acredite que o assassinato da filha tenha sido premeditado, Neuza lembra que a filha, normalmente calada, estava bastante emotiva no dia do crime.

- Ela estava comigo num barzinho, mas depois que entrei ela mandou me avisar que estava com amigos - conta.

Punição: artigo raro no país

Mas nem sempre esses crimes ficam impunes. Em março do ano passado, policiais da Metropol III prenderam Luís Felipe dos Santos Líbano, Sebastião Francisco Alves da Silva, Fábio dos Santos Rosa e Clayton Araújo do Nascimento. Os quatro mataram a psicóloga Marize Barbosa Cavalheiro, de 42 anos, quando tentavam roubar seu Tempra, num cruzamento no Andaraí.

Da mesma forma que Ana Carolina, Marize Monteiro e Sérgio Rabetini, ela também acelerou seu carro para se livrar dos bandidos. Na época, eles disseram que atiraram na psicóloga porque ela reagiu ao assalto.

Para Luiz Carlos Caffaro, do Ministério Público, a solução para o problema está na participação social.

- Não é suficiente colocar policiais nas esquinas sem um trabalho integrado. Para tanto, basta que a sociedade use o Disque-Denúncia (253-1177).

Juventude interrompida

Para a família de Fabiane Freitas da Silva, de 16 anos, resta apenas a imagem da menina alegre, que foi passear na casa da prima, em Cabuçu, e não voltou mais. Fabiane foi encontrada morta na madrugada do dia 25 de março, na Estrada Severino Pereira da Silva, em Queimados, com um tiro na cabeça.

Fabiane estava com um garoto de 14 anos num local próximo à casa da prima, no Conjunto dos Marítimos, em Parque Marapicu, quando foi seqüestrada por dois homens em um Uno preto. O menino foi solto a 500 metros do conjunto e Fabiane levou um soco no olho direito e foi assassinada.

A polícia chegou a desconfiar do namorado de Fabiane, Adriano Pereira, de 23 anos, que foi liberado após dizer que planejava se casar com a moça em junho e estava em casa no momento do crime. A polícia ainda não avançou nas investigações.