Das ruínas à esperança
Moradores de prédio que ruiu somam prejuízos e aguardam ajuda da Prefeitura
RIO (Extra) - Entre as nove famílias que tiveram suas vidas arruinadas junto com o edifício que desmoronou segunda-feira, na Rua Carolina Machado, em Oswaldo Cruz, o casal Andréia e Ricardo Diamantino era não só a imagem da desolação como também a da esperança em reconstruir tudo o que perderam. Os dois moravam numa das coberturas do prédio desde que se casaram, há oito meses.
Ontem, eles voltaram ao local da tragédia. Abraçados o tempo todo, Andréia e Ricardo personificavam o juramento religioso de união "na riqueza e na pobreza; na tristeza e na alegria".
- Casamos e viemos para cá. Vamos começar tudo de novo. Iríamos reunir todo mundo numa festa no Ano Novo. Felizmente nos salvamos antes. Se o prédio caísse durante a festa, todos morreriam - contou Ricardo, que espera recuperar entre os escombros do edifício pedaços de sua história, como as fotos do álbum de casamento.
- A gente tentou recuperar alguma coisa. Espero encontrar roupas, documentos e as fotos do nosso casamento - disse Ricardo, que comprou a cobertura por R$ 24 mil, onde também moravam sua mãe e sua irmã, e agora divide a casa da sogra, em Guadalupe, com os pais de sua mulher.
Mas quem pensa que tanta desgraça resultou em revolta está enganado. O fato de o desabamento ter acontecido às vésperas do Natal serviu para unir os moradores do prédio em torno de um único objetivo - muito mais importante do que a distribuição de presentes ou a tradicional ceia. Eles vão festejar a renovação da esperança. E é com este sentimento que iniciarão o novo ano.
- Para mim, o Natal nunca termina. É o dia do nascimento de Cristo. E, dias depois, virá um Ano Novo com outros obstáculos a serem superados. Não podemos passar a imagem de desânimo para esse povo amargurado. Temos que ter esperança e fé. A gente nunca pode desistir. Nunca - afirmou Jorge Menezes, morador do apartamento 303.
Conselho prova que construção foi ilegal
De acordo com o Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Crea), a construção de mais dois pavimentos no edifício foi ilegal e realizada por profissionais não habilitados. A obra aconteceu há dez anos e a firma responsável deveria ter a anotação de responsabilidade técnica (ART). O documento, que é emitido pelo Crea, visa a reconhecer a execução do trabalho e confirmar a idoneidade da empresa e dos engenheiros ou arquitetos envolvidos.
- Não encontramos a ART dessa obra nos nossos arquivos - disse o presidente do Crea, José Chacon de Assis.
Os moradores do prédio contam que o responsável pela obra já morreu e se chamava João. O problema, no entanto, sobrevive. A Defesa Civil já sabe que o prédio vizinho (1.068) foi construído pela mesma pessoa e prepara uma vistoria detalhada no lugar.
- Aquele edifício vai merecer uma vistoria especial ao longo desta semana. Mas não há razão para pânico - afirmou o coordenador de operações da Defesa Civil, major Robson Milagres.
O presidente do Crea também atribuiu parte da tragédia à negligência da Prefeitura:
- Não houve nenhuma fiscalização.
Segundo a assessoria de imprensa da Secretaria municipal de Urbanismo, o processo que deverá comprovar ou não a autorização da obra ainda não foi encontrado nos arquivos da Prefeitura, que não foram informatizados. Hoje, a responsabilidade pela autorização para ampliações de áreas edificadas cabe à Coordenadoria de Parcelamento e Edificações - contou José Chacon de Assis.
Limpeza ficou só na promessa
O desejo de os moradores recuperarem os pertences quase esbarrou na falta de informações da Prefeitura. Devido a uma série de notícias desencontradas, dezenas de pessoas passaram o dia inteiro à espera de uma equipe da Companhia Municipal de Limpeza Urbana (Comlurb) - ligada diretamente ao gabinete do prefeito Luiz Paulo Conde - para que pudessem peneirar os destroços do prédio. A garantia foi dada por Pedro Paulo Pimenta, gerente de segurança do trabalho da Comlurb.
Segundo Pimenta, 20 garis da empresa, uma pá mecânica e um caminhão limpariam a área para que os moradores buscassem os seus pertences, a partir das 9h.
- Cheguei aqui às 7h e conversei com a gerência de emergência, que havia acionado sua equipe às 9h.
Entretanto, as horas se passaram e ninguém apareceu para limpar o lugar até o fim da tarde, quando a Comlurb abriu uma exceção. Segundo a Gerência de Comunicação da empresa, os garis só agiriam na área interditada pela Defesa Civil com solicitação oficial do órgão, que apenas requisitou a retirada do entulho que se espalhou na rua.
Mas a concessão não amenizou as críticas à Prefeitura:
- Dependemos das máquinas da Comlurb para vasculharmos tudo e recuperar alguma coisa - reclamou Jorge Menezes, às 10h.
- Não tivemos qualquer apoio da Prefeitura - completou Cosme Pérez Guedes, morador da cobertura e responsável pelo alerta que salvou todos os moradores.
Morávamos aqui desde o casamento
Ricardo Diamantino e a mulher Andréia perderam tudo no desabamento do prédio onde moravam desde que se casaram
'Estou satisfeito, continuo vivo'
Chocados pelo desabamento do prédio em que moravam, os ex-proprietários do edifício ainda não se recuperaram da tragédia e estão preocupados apenas em retomar suas vidas. Para eles, o Natal será uma data para reconstruir a esperança no futuro e comemorar o fato de estarem vivos. Por isso, a palavra desespero está riscada de seus dicionários.
- Estamos anestesiados. Não adianta gritar ou se desesperar. Vou ter que correr atrás e ninguém vai fazer isso por mim. Vou passar o Natal com uma amiga, tomando uma cerveja gelada e comemorando um futuro melhor. São coisas da vida, que tem seus altos e baixos - ensina Jorge Menezes, tentando animar os demais vizinhos.
- Nem sei como vai ser esse Natal. Nem pensei nisso. Só em estar vivo está bom - conta Ricardo Diamantino, enquanto olha o que sobrou de seus sonhos.
Considerado herói por todos ao avisar do risco de desabamento, Cosme Pérez Guedes, compartilha da opinião de Ricardo.
- Foi a maior pancada que já levei em minha vida, mas estou satisfeito, porque continuo vivo - disse.
Sentada sob uma varanda, a dona de casa Eva Helena Araújo esperava a hora de reaver, pelo menos, as fotos de sua neta de 10 anos. Serena, ela concorda que o momento é para ter calma:
- Desespero não adianta.
Tenente apita e organiza
PM do 9º BPM faz lista e dá crachás aos moradores
Em meio a tanta confusão e desorientação, uma figura se destacou. Graças ao tenente PM Delano Clementino, do 9º BPM (Rocha Miranda), o desespero não se instalou entre os ex-proprietários dos apartamentos destruídos.
Há dez anos, o policial também presenciou outro desabamento, na Rua Navarro, no Morro da Coroa, em Santa Teresa. Na época, ele estava lotado no 1 BPM (Catumbi).
Assim que chegou à Carolina Machado, o tenente Delano tratou de organizar uma lista com o nome de cada um dos moradores do prédio.
Além disso, o oficial também providenciou vários crachás junto à Subprefeitura de Madureira, distribuindo-os a cada um deles, facilitando a busca dos objetos. Modesto, o PM diz que não fez nada demais, apenas cumpriu o seu dever.
- O pessoal está desesperado. Não fiz nada além da minha obrigação. Eles são contribuintes e tenho que fazer o mínimo possível. Sempre trabalho assim - contou o tenente, enquanto reunia os moradores em torno do carro-patrulha, chamando um a um.
- A PM nos deu o maior apoio. O tenente Delano está nos ajudando desde que chegamos de manhã - confirmou o morador Jorge Menezes.
- Eles estão nos ajudando bastante, organizando tudo. Estamos todos confusos e eles deram um rumo para a gente - garantiu Ricardo Diamantino
RIO (Extra) - Entre as nove famílias que tiveram suas vidas arruinadas junto com o edifício que desmoronou segunda-feira, na Rua Carolina Machado, em Oswaldo Cruz, o casal Andréia e Ricardo Diamantino era não só a imagem da desolação como também a da esperança em reconstruir tudo o que perderam. Os dois moravam numa das coberturas do prédio desde que se casaram, há oito meses.
Ontem, eles voltaram ao local da tragédia. Abraçados o tempo todo, Andréia e Ricardo personificavam o juramento religioso de união "na riqueza e na pobreza; na tristeza e na alegria".
- Casamos e viemos para cá. Vamos começar tudo de novo. Iríamos reunir todo mundo numa festa no Ano Novo. Felizmente nos salvamos antes. Se o prédio caísse durante a festa, todos morreriam - contou Ricardo, que espera recuperar entre os escombros do edifício pedaços de sua história, como as fotos do álbum de casamento.
- A gente tentou recuperar alguma coisa. Espero encontrar roupas, documentos e as fotos do nosso casamento - disse Ricardo, que comprou a cobertura por R$ 24 mil, onde também moravam sua mãe e sua irmã, e agora divide a casa da sogra, em Guadalupe, com os pais de sua mulher.
Mas quem pensa que tanta desgraça resultou em revolta está enganado. O fato de o desabamento ter acontecido às vésperas do Natal serviu para unir os moradores do prédio em torno de um único objetivo - muito mais importante do que a distribuição de presentes ou a tradicional ceia. Eles vão festejar a renovação da esperança. E é com este sentimento que iniciarão o novo ano.
- Para mim, o Natal nunca termina. É o dia do nascimento de Cristo. E, dias depois, virá um Ano Novo com outros obstáculos a serem superados. Não podemos passar a imagem de desânimo para esse povo amargurado. Temos que ter esperança e fé. A gente nunca pode desistir. Nunca - afirmou Jorge Menezes, morador do apartamento 303.
Conselho prova que construção foi ilegal
De acordo com o Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Crea), a construção de mais dois pavimentos no edifício foi ilegal e realizada por profissionais não habilitados. A obra aconteceu há dez anos e a firma responsável deveria ter a anotação de responsabilidade técnica (ART). O documento, que é emitido pelo Crea, visa a reconhecer a execução do trabalho e confirmar a idoneidade da empresa e dos engenheiros ou arquitetos envolvidos.
- Não encontramos a ART dessa obra nos nossos arquivos - disse o presidente do Crea, José Chacon de Assis.
Os moradores do prédio contam que o responsável pela obra já morreu e se chamava João. O problema, no entanto, sobrevive. A Defesa Civil já sabe que o prédio vizinho (1.068) foi construído pela mesma pessoa e prepara uma vistoria detalhada no lugar.
- Aquele edifício vai merecer uma vistoria especial ao longo desta semana. Mas não há razão para pânico - afirmou o coordenador de operações da Defesa Civil, major Robson Milagres.
O presidente do Crea também atribuiu parte da tragédia à negligência da Prefeitura:
- Não houve nenhuma fiscalização.
Segundo a assessoria de imprensa da Secretaria municipal de Urbanismo, o processo que deverá comprovar ou não a autorização da obra ainda não foi encontrado nos arquivos da Prefeitura, que não foram informatizados. Hoje, a responsabilidade pela autorização para ampliações de áreas edificadas cabe à Coordenadoria de Parcelamento e Edificações - contou José Chacon de Assis.
Limpeza ficou só na promessa
O desejo de os moradores recuperarem os pertences quase esbarrou na falta de informações da Prefeitura. Devido a uma série de notícias desencontradas, dezenas de pessoas passaram o dia inteiro à espera de uma equipe da Companhia Municipal de Limpeza Urbana (Comlurb) - ligada diretamente ao gabinete do prefeito Luiz Paulo Conde - para que pudessem peneirar os destroços do prédio. A garantia foi dada por Pedro Paulo Pimenta, gerente de segurança do trabalho da Comlurb.
Segundo Pimenta, 20 garis da empresa, uma pá mecânica e um caminhão limpariam a área para que os moradores buscassem os seus pertences, a partir das 9h.
- Cheguei aqui às 7h e conversei com a gerência de emergência, que havia acionado sua equipe às 9h.
Entretanto, as horas se passaram e ninguém apareceu para limpar o lugar até o fim da tarde, quando a Comlurb abriu uma exceção. Segundo a Gerência de Comunicação da empresa, os garis só agiriam na área interditada pela Defesa Civil com solicitação oficial do órgão, que apenas requisitou a retirada do entulho que se espalhou na rua.
Mas a concessão não amenizou as críticas à Prefeitura:
- Dependemos das máquinas da Comlurb para vasculharmos tudo e recuperar alguma coisa - reclamou Jorge Menezes, às 10h.
- Não tivemos qualquer apoio da Prefeitura - completou Cosme Pérez Guedes, morador da cobertura e responsável pelo alerta que salvou todos os moradores.
Morávamos aqui desde o casamento
Ricardo Diamantino e a mulher Andréia perderam tudo no desabamento do prédio onde moravam desde que se casaram
Tentamos recuperar alguma coisa. Pegamos documentos e roupas antes de sair. Nunca vimos nada de errado no prédio. Morávamos aqui há oito meses e foi a nossa primeira casa desde que nos casamos. Gastamos R$ 24 mil para comprar essa cobertura e perdemos tudo porque não estava no seguro.
A gente estava combinando de fazer uma festa de Ano Novo com todo mundo. Ainda bem que aconteceu assim. Se fosse no dia da festa, todos poderiam morrer soterrados aqui.
'Estou satisfeito, continuo vivo'
Chocados pelo desabamento do prédio em que moravam, os ex-proprietários do edifício ainda não se recuperaram da tragédia e estão preocupados apenas em retomar suas vidas. Para eles, o Natal será uma data para reconstruir a esperança no futuro e comemorar o fato de estarem vivos. Por isso, a palavra desespero está riscada de seus dicionários.
- Estamos anestesiados. Não adianta gritar ou se desesperar. Vou ter que correr atrás e ninguém vai fazer isso por mim. Vou passar o Natal com uma amiga, tomando uma cerveja gelada e comemorando um futuro melhor. São coisas da vida, que tem seus altos e baixos - ensina Jorge Menezes, tentando animar os demais vizinhos.
- Nem sei como vai ser esse Natal. Nem pensei nisso. Só em estar vivo está bom - conta Ricardo Diamantino, enquanto olha o que sobrou de seus sonhos.
Considerado herói por todos ao avisar do risco de desabamento, Cosme Pérez Guedes, compartilha da opinião de Ricardo.
- Foi a maior pancada que já levei em minha vida, mas estou satisfeito, porque continuo vivo - disse.
Sentada sob uma varanda, a dona de casa Eva Helena Araújo esperava a hora de reaver, pelo menos, as fotos de sua neta de 10 anos. Serena, ela concorda que o momento é para ter calma:
- Desespero não adianta.
Tenente apita e organiza
PM do 9º BPM faz lista e dá crachás aos moradores
Em meio a tanta confusão e desorientação, uma figura se destacou. Graças ao tenente PM Delano Clementino, do 9º BPM (Rocha Miranda), o desespero não se instalou entre os ex-proprietários dos apartamentos destruídos.
Há dez anos, o policial também presenciou outro desabamento, na Rua Navarro, no Morro da Coroa, em Santa Teresa. Na época, ele estava lotado no 1 BPM (Catumbi).
Assim que chegou à Carolina Machado, o tenente Delano tratou de organizar uma lista com o nome de cada um dos moradores do prédio.
Além disso, o oficial também providenciou vários crachás junto à Subprefeitura de Madureira, distribuindo-os a cada um deles, facilitando a busca dos objetos. Modesto, o PM diz que não fez nada demais, apenas cumpriu o seu dever.
- O pessoal está desesperado. Não fiz nada além da minha obrigação. Eles são contribuintes e tenho que fazer o mínimo possível. Sempre trabalho assim - contou o tenente, enquanto reunia os moradores em torno do carro-patrulha, chamando um a um.
- A PM nos deu o maior apoio. O tenente Delano está nos ajudando desde que chegamos de manhã - confirmou o morador Jorge Menezes.
- Eles estão nos ajudando bastante, organizando tudo. Estamos todos confusos e eles deram um rumo para a gente - garantiu Ricardo Diamantino

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