Dias de Notícias

Notícias escritas e assinadas por mim, Marcelo Dias, a partir de 1998.

quinta-feira, junho 04, 1998

As cicatrizes da batalha

A comunidade de Vicente de Carvalho ainda está em choque com tiroteio

RIO (Extra) As marcas da guerra, que teve como cenário o bairro de Vicente de Carvalho, na noite de terça-feira, podiam ser vistas ontem, nas lojas próximas à estação do metrô. Várias estavam perfuradas por balas de fuzis, metralhadoras e pistolas utilizadas no confronto entre policiais e assaltantes. Os momentos de terror, que há tempos não eram vividos no bairro, ainda estavam na lembrança dos comerciantes e moradores.

Um comerciante, que não quis se identificar temendo represálias, revelou ter visto o bando se reunindo poucos antes de tentar roubar os carros.

- Cerca de 15 deles se reuniram na calçada, conversaram rápido e depois se espalharam pela estrada. Quando o sinal fechou, eles começaram a agir, só que os policiais chegaram juntos. Isso aqui virou um inferno - lembrou.

O balconista de uma loja revelou que os seguranças do carro-forte que recolhe o dinheiro da estação do metrô se assustaram e começaram a atirar nos bandidos.

- Um policial chegou a pensar que eram mais assaltantes, mas depois descobriram que eram os seguranças. Um dos bandidos morreu numa vila aqui perto.

- As pessoas invadiram o bar, tentando se esconder das balas. Nunca vi coisa igual.

Até sapato foi baleado

De manhã cedo, o sapateiro Manoel Duarte contabilizava seu prejuízo, que ele estima ter ficado em torno de R$ 300. A loja dele foi atingida por várias balas, que estilhaçaram a porta, estragaram seu cartaz de propaganda, quebraram vidros das prateleiras, e, ainda por cima, furaram o sapato de um cliente, esperando conserto, o que representou um custo de R$ 35, já que ele vai ter que comprar outro par para o freguês, para não ficar desacreditado na vizinhança.

- Quando eu abri a loja de manhã, levei um susto enorme. Parece que tinha havido uma guerra aqui dentro. A parede ficou arrebentada pelos tiros, isso sem falar na porta e na placa que sempre costumo colocar do lado de fora, que ficaram parecendo tábua de tiro ao alvo, de tantas balas que levaram - reclamou, muito aborrecido.

Apesar de tudo, Duarte pode ser considerado uma pessoa de sorte. Ele comprou a loja há três meses, mas nunca presenciou uma guerra. Nem mesmo desta vez, pois teve a felicidade, como ele mesmo ressaltou, de ter fechado as portas 20 minutos antes do começo da troca de tiros entre a polícia e os bandidos na Estrada de Vicente de Carvalho.

- Eu fechei e fui para o Carrefour. Fiquei um bom tempo fazendo compras. Não escutei sequer um tiro.

Apesar dos pesares, e do prejuízo, o sapateiro Manoel vai continuar onde está. Sinal de que os negócios dele devem estar indo muito bem.

- Isso não acontece todos os dias. Um raio não cai duas vezes no mesmo lugar.

com Ana Cristina Campos e Fábio Gusmão