Dias de Notícias

Notícias escritas e assinadas por mim, Marcelo Dias, a partir de 1998.

domingo, fevereiro 07, 1999

Rio terá curso de segurança pública

Proposta de pós-graduação, inédita na América Latina, quer integrar ação policial ao meio social. As aulas começam no próximo semestre

RIO (Extra) - O governador Anthony Garotinho pretende fazer do Rio de Janeiro um modelo em política de segurança pública para o Brasil e toda a América Latina. Para isso, determinou que a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) elaborasse um curso de pós-graduação voltado para todos os agentes de segurança (polícias civil e militar, bombeiros e Defesa Civil). O projeto do Curso em Segurança Social será entregue ao governador até amanhã, devendo ser implementado no início do segundo semestre deste ano.

O principal objetivo da pós-graduação, com duração de três anos, será integrar a ação policial ao meio social em que ela acontece, interagindo com as diferentes realidades vividas pela população. Entre as disciplinas do currículo do curso, estão antropologia, sociologia, psicologia, direito, informática e história. O entusiasmo pela idéia é tão grande, que a cúpula do Governo a considera uma virada radical na concepção de segurança no país.

Segundo o criador do projeto, o subsecretário estadual de Ciência e Tecnologia, Ricardo Vieiralves, ex-subreitor de Pós-Graduação e Pesquisa da Uerj, apenas cinco países possuem algo semelhante: Canadá, Estados Unidos, Alemanha, França e Grã-Bretanha.

- O nível de escolaridade formal não é qualificador para a pessoa realizar uma investigação. Queremos que ela aprenda mecanismos de processos de investigação e entendimentos de situações sociais, como o das gangues de bairro, em Ipanema. Isso é um problema de sociologia. Não se trata só de política de estado, mas também de organização social. Entendendo isso, o trabalho fica muito mais preciso. Só com a escolaridade tradicional, não dá - raciocina Vieiralves.

De acordo com o subsecretário de Segurança, Luiz Eduardo Soares, o estado ocupa a vanguarda no que se refere à produção de uma política de segurança aliada aos aspectos sociais:

- Pela primeira vez, investiremos na qualificação de profissionais de alto nível, dando uma visão integrada à sociedade, uma perspectiva global. Acho que vamos atrair quadros até de outros estados.

Enfático, Ricardo Vieiralves considera a proposta uma "revolução na polícia do Brasil":

- Será uma virada radical.

Idéia aprovada por delegados

A proposta de criação de um curso de pós-graduação, mesclando segurança e cidadania, foi comemorada pelos delegados das principais divisões especializadas da Polícia Civil. Para o diretor da Divisão Anti-Seqüestro (DAS), Marcos Reimão, faltava ao estado investir nesse tipo de formação policial.

- A principal meta deve ser investir no homem. Fiz um curso semelhante há cinco anos, também na Uerj, no qual discutimos cidadania, direitos humanos e contradições sociais. É preciso investigar e interagir, para que possamos nos infiltrar nas comunidades - conta Reimão, responsável pela equipe considerada uma ilha de excelência na polícia.

Com dois cursos de especialização em resgate realizados no ano passado, em Israel e nos Estados Unidos, o delegado Márcio Franco, diretor da Delegacia de Roubos e Furtos, diz que o projeto irá aumentar o potencial das investigações:

- Esse enfoque social é importante, porque devemos saber lidar até com linguajar diferente. Mesclar direito, comunicação, psicologia com a ação policial potencializa o nosso trabalho.

Proposta é bem aceita pela PM

Considerada violenta por organizações de defesa dos direitos humanos, a Polícia Militar já foi apresentada pelo subsecretário de Segurança, Luiz Eduardo Soares, ao projeto do Curso em Segurança Social. Na quinta-feira passada, ele discutiu a proposta com o comandante do 9 BPM (Rocha Miranda), tenente-coronel Carlos Alberto Silva.

- Sou adepto da idéia. A pós-graduação será muito importante, fornecendo uma visão global de toda a situação em que vivemos. Sinto que há um entusiasmo muito grande em torno do plano - diz o oficial, líder do batalhão que já protagonizou episódios como o da chacina de Vigário Geral, em 1993.

O comandante do 16 BPM (Olaria), tenente-coronel Jorge Duarte, compartilha da opinião de Silva. Atuando em uma área problemática - o Complexo do Alemão -, Duarte aplaude a decisão do governador:

- Conversei com subsecretário e ele disse que direitos humanos não é o direito do bandido, mas uma questão social. Não basta combater o crime. É preciso conhecer o terreno em que pisamos. Falta uma interação maior. É a primeira vez que vejo um governo lidar com isso profundamente, tentando puxar os policiais para os problemas da sociedade.