Dias de Notícias

Notícias escritas e assinadas por mim, Marcelo Dias, a partir de 1998.

quinta-feira, agosto 13, 1998

O inocente volta às ruas

Acusado de estupro e tachado de monstro, Gilberto passou 5 dias na cadeia

NATIVIDADE (Extra) - O biscateiro Gilberto Emilce dos Santos, de 22 anos, recuperou a liberdade ontem à noite. Gilberto passou cinco dias preso na delegacia de Natividade como suspeito de ter assassinado a menina Índila Freitas da Silva, de 8 anos, estuprada e morta, quinta-feira passada, em Itaperuna. O pesadelo dele começou na tarde de sábado, na delegacia de Itaperuna, e terminou na terça-feira, com a prisão do verdadeiro culpado, Adriano da Silva.

O rapaz só respirou aliviado depois que teve sua inocência confirmada ao apertar a mão do pai de Índila, o caminhoneiro Ademário Batista da Silva, durante o reconhecimento de Adriano, no 29 BPM.

Sorridente, de monstro definitivamente Gilberto não tem nada. Jeitão simples, típico de quem é da roça, ele agora só quer esquecer o drama de pagar por algo que não fez. Boa praça, cumprimentou todos os policiais e detentos da 140 DP. Nem parecia o mesmo sujeito que quase foi linchado por cerca de 300 pessoas, em Itaperuna. A tragédia só foi evitada porque o delegado da cidade, Murilo Montanha, o transferiu para a carceragem de Natividade.

- O pai da menina me pediu desculpas ontem (anteontem). Disse que estava nervoso quando afirmou que fui eu que matei sua filha - contou.

Apesar do medo que sentiu quando chegou ao xadrez, ele diz que não pretende processar o estado por ter sido acusado e apresentado à população como o assassino de Índila. O temor, no entanto, desapareceu dentro da própria cela. Dos 28 presos da delegacia de Natividade, 21 são evangélicos. A maioria está presa por furto e homicídio:

- A polícia fez o seu trabalho e eu faria a mesma coisa também. Imaginava que encontraria o pior na cadeia. No início, alguns ficaram nervosos por causa dessa história, mas, depois, viram que não fui eu e me deram apoio. Eles até me emprestaram roupas, sabonete e cobertor. Agora tenho uma nova família em Natividade.

Gilberto não pretende voltar tão cedo para casa, na Fazenda Jaboticaba. Magoado com a acusação, ele irá para a casa de um tio, em Bom Jesus de Itabapoana.

Pais temiam linchamento

Feliz com a liberdade de Gilberto, o casal de lavradores Teresinha e José dos Santos Carvalho contou a angústia de ver o filho atrás das grades. Com lágrimas nos olhos, dona Teresinha disse que deixou de comer com medo de ser atacada pelo mesmo grupo que tentou linchar o rapaz:

- Fiquei muito triste. Chorei muito porque ele não fez nada. Tínhamos medo de alguém vir aqui e bater na gente. Deixei até de me alimentar. Ele é um menino muito bom. Sempre o ensinei a não arranjar confusão na rua. Agora estou muito alegre porque ele saiu da cadeia.

Acompanhando o drama de Gilberto desde o início, seu José lembra cada detalhe do que aconteceu nestes cinco dias. Desde o momento em que soube da acusação pelo assassinato de Índila até a apresentação do verdadeiro criminoso, no 29 BPM. Sem saber o que fazer, ele até aconselhou o filho a não ir à delegacia:

- Falei para ele não ir por que não tinha nada a ver com isso. Mas ele é decidido e queria acabar logo com isso.

O nome de Gilberto chegou à polícia na noite de sexta-feira, quando uma equipe da delegacia de Itaperuna foi à sua casa, na Fazenda Jaboticaba.

- A gente não sabia que o Gilberto estava na casa de uma amiga, que é enrabichada com ele. Pensamos que ele tinha ido à delegacia, mas não estava lá. Só o encontramos no sábado, por volta de uma da tarde. Nesse tempo, o procurei junto com os policiais, que chegaram a me levar para a casa dos pais da menina para que me reconhecessem - contou.

A angústia dos pais de Gilberto começou no momento da prisão. Segundo o lavrador, o rapaz foi ameaçado fisicamente:

- A polícia até o ameaçou. Isso machuca a gente. Esse foi o maior sofrimento que já enfrentamos. É duro ver o seu filho levado para a cadeia com todas aquelas pessoas fazendo injúrias. Não foi fácil.

O alívio definitivo veio terça-feira, no Batalhão de Itaperuna, onde o pai de Índila, Ademário Batista Silva, reconheceu o assassino da filha.