Dias de Notícias

Notícias escritas e assinadas por mim, Marcelo Dias, a partir de 1998.

sábado, setembro 19, 1998

’Mãe, me tira logo daqui!’

Preso há cinco dias, ex-Polegar sofre com falta de drogas e pede tratamento

RIO (Extra) - Quando Rafael apareceu anteontem na televisão limpo, de cabelo cortado e com a barba feita, houve quem ficasse surpreso com sua rápida recuperação. Mas cabe aqui um lugar comum: as aparências realmente enganam. Sem usar drogas há cinco dias, Rafael está começando a ter crises de abstinência.

- Eu falei com ele hoje de manhã e ele estava com a voz trêmula, está tendo crises por causa da droga. Ele pediu: mãe, me ajuda, me tira logo daqui, preciso de remédio, mãe, qualquer coisa - disse a mãe de Rafael, Silvia Vieira.

Segundo a mãe, Rafael está deprimido com a prisão. Ele esperava sair mais rápido, mas à medida que os dias passam seu estado piora. Vera Regina Fontes, advogada amiga da família, visitou Rafel ontem e disse que ele pediu antidepressivo e sente dor no estômago.

Desde que o ex-Polegar foi preso, só ontem sua mãe conseguiu falar com ele, pelo telefone. Querendo evitar o assédio da imprensa, Sílvia não foi até a delegacia. Segundo ela, o contato com a família está sendo prejudicado pelo advogado de Rafael, Marlon Wander.

- Eu não sei o que está acontecendo porque eu mando recados pelo advogado, mas ele não repassa ao Rafael. O advogado está se reportando à TV Record - acusa.

É um problema que Silvia pretende resolver: quer destituir o advogado. Marlon se defende, diz que é advogado de Rafael e não da Record. Perguntado sobre quem estava pagando os honorários, já que Rafael não tem dinheiro, Marlon não responde.

- Por razões éticas, não vou entrar nessa questão. Conversei com Rafael e ele afirmou que confia em mim - disse Marlon, que ontem entrou com outro pedido de liberdade provisória.

Marlon confirma que Rafael só assinou a procuração dois dias depois de preso. Silvia afirma que seu filho aceitou mudar de advogado e que ainda ontem iria revogá-la.

- Ele é o Marlon, mas não é o Brando. Todo mundo tem direito a seus 15 minutos de fama - ironizou a mãe.

Drama traduzido em livro

O tratamento de Rafael na Clínica Greenwood, escolhida por sua mãe, poderia levar até três anos, dependendo do estado do paciente. E os gastos ultrapassariam a casa dos R$ 80 mil. Mas sua família não tem como conseguir essa quantia. Só resta à mãe apelar:

- Para mim, esse dinheiro é muito, mas para muita gente não é nada. O doador poderia deduzir o dinheiro do Imposto de Renda, no fim das contas essa caridade não ia custar nada.

Silvia lembra que Rafael já passou por dezenas de internações e fez até tratamentos alternativos como a cromoterapia, mas não conseguiu se livrar do vicío que o colocou na cadeia.

Ela está pensando em escrever um livro sobre o drama de seu filho. Lá vão estar histórias do garoto que, de tão inteligente chegou a ser chamado para uma escola de gênios:

- Eu não deixei porque eu queria que meu filho tivesse uma criação normal.

Uma informação, porém, não vai estar nas páginas do livro: quem foi a namorada que levou Rafael para o mundo das drogas, quando ele tinha 14 anos. Silvia não sabe sequer o nome dela e nem em que colégio a garota estudava. Ela só sabe o que aconteceu depois.

Presos tratam bem o cantor

As memórias do cárcere de Rafael não serão tão duras assim: ele está sendo muito bem tratado pelos outros 20 presos com que divide a cela, onde só caberiam 12. Pelas regras da cadeia, por causa da superlotação, Rafael teria que dormir e ficar o tempo todo perto do buraco usado como privada pelos presos, chamado de corró. Escapou dessa: ganhou um lugar melhor para dormir.

Ele está comendo a mesma comida dos outros presos, mas tem recebido presentes de fora: ontem, uma advogada amiga da família levou três pacotes de cigarro. Logo no segundo dia de prisão, os próprios presos cortaram o cabelo de Rafael, tirando os caracóis que lhe davam um ar de mendigo.

Se ajuda a tornar sua passagem na prisão menos desagradável, esse tratamento, porém, não o livra da depressão.

Advogado sob fogo cruzado

Mãe de Rafael diz que Marlon só quer aparecer

O advogado Marlon Wander está sob fogo cruzado. Depois de aparecer como o salvador de Rafael, tem sua competência questionada pela mãe do ex-polegar, que quer outro advogado defendendo o filho.

- Não é nada pessoal, minha restrição contra ele é apenas profissional.

Silvia diz que Marlon não anexou ao processo o exame feito por Rafael no IML que poderia comprovar sua dependência. O advogado prefere não polemizar: diz apenas que ela é leiga. Marlon afirma que pensa em não cobrar para defender Rafael, já que estaria só interessado no bem estar do rapaz.

Clínica é referência nacional

O ex-Polegar Rafael Ilha vai precisar de muito mais do que força de vontade para se livrar das drogas. O tratamento de desintoxicação pretendido por sua mãe, Sílvia Alves Pereira, na clínica Greenwood, em São Paulo, custa entre R$ 5.890 e R$ 13.390 por mês no primeiro semestre. Dependendo do paciente, o prazo médio de recuperação é de dois anos e oito meses, fazendo com que a terapia ultrapasse R$ 41 mil, podendo chegar a R$ 86 mil.

A Greenwood é considerada um centro de referência nacional e foi sugerida à família de Rafael por um dos médicos de Vera Fischer.

- A técnica deles é excelente - diz José Roberto Nunes, psiquiatra que a atendeu na Clínica Solar do Rio.

O tratamento é dividido em três fases, sendo que na primeira o paciente fica internado na sede campestre da Greenwood, em Itapecerica da Serra. Esse estágio dura, pelo menos, seis meses, quando o doente conquista privilégios conforme seus avanços, como sair nos fins de semana e visitar a família.

- O paciente chega agressivo e não sai se não puder conviver com outras pessoas. Nessa fase, ele aprende a suportar frustrações e a viver em comunidade. Mas a decisão de manter o tratamento é dele - explica o diretor Cirilo Tissot.

Após esta etapa, o doente vai para a capital paulista, onde terá atividades como técnicas de relaxamento e comunicação, além de sessões psicanalíticas e exercícios físicos. Em São Paulo, o paciente fica na clínica somente das 9h às 17h. Vencido esse estágio, de, aproximadamente, dois meses, vem a fase final, de acompanhamento psicoterápico e neuroquímico durante dois anos.

De Nelito Fernandes
Com Marcelo Dias e Milene Ponce de Leon